quarta-feira, 26 de dezembro de 2012


“UM DESFILE DE UNHAS” 

(OU COMO A FUTILIDADE TOMOU DE ASSALTO A SOCIEDADE”)

Eu sou assinante da Sky, TV por assinatura, e ela é a responsável por preencher alguns os meus momentos de ócio preguiçoso diante do televisor. E o faz com imagens lindas e interessantes de animais dos mais variados,  de planetas , sóis, estrelas,  constelações,  com alguns filmes adoráveis ou nem tanto, com notícias de todo canto,  com séries que acabam com a seriedade dos meus dias e com outras coisas assim, que se sucedem no brilho da minha telinha. Programas, programas dos mais variados, a toda e qualquer hora, sempre a postos para me entreter por algum tempo.

Da maior parte deles eu gosto, e sempre que possível lá estou eu gargalhando com Sheldon Cooper ou morrendo de saudade com Bonanza, Arquivo X, Star Treck. Às vezes, só para passar o tempo, fico aprendendo pratos deliciosos que jamais prepararei com a Nigela ou viajando mundo afora com exploradores que me mostram coisas e lugares que jamais verei ao vivo e em cores. Tudo muito bom, tudo leve e gostoso.

Mas outro dia eu passei, por acaso, por um programa num canal qualquer, acho eu que no Multishow, e parei para ver por mera curiosidade. Quase não consegui acreditar nos meus olhos e ouvidos quando comecei a ver as imagens e ouvir as entrevistas. Tratava-se de um “desfile de unhas”, onde garotas pintavam suas unhas de maneiras “criativas”, adornavam suas mãos com laços, anéis, pulseiras, mais o escambau a quatro e faziam seus dedinhos caminharem por um tapetinho como se fossem pessoinhas desfilando, enquanto que duas mulheres nem tão jovens, as sofisticadas promotoras do evento, explicavam sobre a utilidade e absoluta necessidade de se apoiar um evento daquele tipo, visto que pintar as unhas hoje em dia não é mais apenas um detalhe, mas uma grande produção que centraliza as atenções de todos em eventos sociais.

Fiquei meio que suspensa no ar por alguns segundos, sem saber se realmente poderia acreditar naquilo que estava vendo e ouvindo.  Demorou um pouco para a ficha cair: aquelas mulheres ricas,  sorridentes e fúteis, estavam mesmo  falando um blá blá blá tipo besteirol completo sobre unhas decoradas, enquanto o mundo está pegando fogo.

As unhas desfilam no tapetinho enquanto os israelenses estão assassinando civis palestinos todo santo dia, com as bênçãos do governo norte-americano e a elegante indiferença internacional; favelas estão sendo metódica e criminosamente queimadas a cada novo dia em alguma grande cidade do Brasil para dar espaço à especulação imobiliária; o mensalão periga não dar em nada que se possa realmente chamar de justo; nossa presidente corta verbas da Saúde e da Educação nacionais e empresta bilhões para Cuba; a África sucumbe diante da violência, da fome, e milhares de criança morrem de subnutrição todos os dias; os escândalos políticos se sucedem um após o outro; os serviços públicos brasileiros estão em estado de calamidade e as fulanas fazem um desfile de unhas, que é filmado e divulgado na grande mídia como um evento digno de nota.

Sou só eu que acho que esta coisa toda está alienada e delirante demais, que está podre além da conta, que a falta de bom senso bateu seu maior recorde ou tem mais alguém que pense assim?  Serei apenas eu a chata de plantão, aquela que não delira com uma novidade destas, ou haverá mais pessoas como eu, pessoas que conseguem enxergar o tamanho deste engano, um engano recheado de lorotas e ilusões, em que está mergulhando a nossa sociedade?

E ainda há as perguntas que não querem calar: existe futuro e salvação para uma humanidade em que um desfile de unhas acontecendo num tapetinho de mentirinha é um fato relevante, a ponto de um canal de TV fazer um programa sobre isto? Minha mãe terá tomado LSD durante a gravidez ou o mundo é assim mesmo?

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